domingo, novembro 30, 2014

Noturno da Rua da Lapa – Recital de Violão: Felipe Anunciação e Robert Moura





Como parte do curso de Música – Bacharelado em Instrumento (Violão) da Escola de Música da UEMG (Universidade do Estado de Minas Gerais), no dia 9 de dezembro, realizarei um recital de violão clássico. A apresentação será em parceria com meu amigo, Felipe Anunciação. Tocaremos peças solos e faremos um duo no final do espetáculo. O repertório é todo composto por obras de compositores brasileiros: Heitor Villa-Lobos, Guerra-Peixe, Radamés Gnattalli, Dilermando Reis, Ernesto Nazareth, Garoto, Baden Powell e Egberto Gismonti.

Embora não esteja diretamente ligado à música, o título do recital, Noturno da Rua da Lapa, foi inspirado no poema homônimo de Manuel Bandeira. Ele tem a intenção de ressaltar o Brasil, e mais especificamente, o Rio de Janeiro, tendo o bairro da Lapa como palco, e a influência do choro, em especial, nas obras que serão apresentadas no programa.


NOTURNO DA RUA DA LAPA

Manuel Bandeira

A janela estava aberta. Para o que não sei, mas o que entrava
era o vento dos lupanares, de mistura com o eco que se partia
nas curvas cicloidais, e fragmentos do hino da bandeira.

        Não posso atinar no que eu fazia: se meditava, se morria
de espanto ou se vinha de muito longe.

       Nesse momento (oh! por que precisamente nesse mo-
mento?...) é que penetrou no quarto o bicho que voava, o ar-
ticulado implacável, implacável!

      Compreendi desde logo não haver possibilidade alguma
de evasão. Nascer de novo também não adiantava. - A
bomba de flit! pensei comigo, é um inseto!

      Quando o jacto fumigatório partiu, nada mudou em
mim; os sinos da redenção continuaram em silêncio; nenhu-
ma porta se abriu nem fechou. Mas o monstruoso animal
FICOU MAIOR. Senti que ele não morreria nunca mais, nem
sairia, conquanto não houvesse no aposento nenhum busto
de Palas, nem na minhalma, o que é pior, a recordação per-
sistente de alguma extinta Lenora.

Libertinagem, 1930

Todos convidados!


Noturno da Rua da Lapa – Recital de Violão Clássico com Felipe Anunciação e Robert Moura

Local: Auditório Fernando Coelho - Escola de Música da UEMG - Rua Riachuelo, 1351, Padre Eustáquio. BH/MG
Data: 09/12   
Horário: 20h
Entrada Franca 


Ainda: amanhã às 9h16 participarei de uma audição de música antiga interpretando obras de Sylvius Leopold Weiss e John Dowland também na Escola de Música da UEMG.






domingo, novembro 16, 2014

Rock’n Geral 5





Depois de onze anos, estou produzindo novamente o evento Rock’n Geral, nome extraído de uma música presente no primeiro disco do Barão Vermelho e que também nomeia o quinto álbum da carreira da banda, e serviu de inspiração para o título deste blog e um programa de rádio apresentado por este que vos escreve. Como não poderia ser mais óbvio, o título teve o intuito de ressaltar a mescla de estilos entre as bandas convidadas, que com a próxima edição completará um total de 21 bandas participantes. O primeiro Rock’n Geral foi realizado em 2002, e teve suas outras três edições em 2003. A retomada do projeto se deu de forma acidental, mas vem com o mesmo ânimo e disposição presentes nas outras edições.

As bandas participantes do Rock’n Geral 5 serão: Bigodd’s de indie rock, Conteúdo Básico apresentando trabalho autoral e releituras de rock nacional e internacional, e a banda de blues Cafebluesband. O evento ocorrerá na Casa Cultural Matriz, palco de todas as outras edições, no dia 7 de dezembro, a partir das 21h. 

Tanto tempo depois, é inegável certa dose de saudosismo da minha parte, no entanto não estarei tocando nessa edição, mas será uma grande satisfação ver ao vivo os trabalhos da banda Bigodd’s e Cafebluesband, e rever a banda Conteúdo Básico, antiga parceira em vários shows que realizei tanto produzindo quanto tocando.

Aguardamos a presença dos amigos presentes nas outras edições, como de novos adeptos. Então, é só chegar porque como diria Cazuza: “Rock’n Geral é até mais tarde”... e no dia seguinte é feriado em Belo Horizonte. 

Local: Casa Cultural Matriz – http://matrizbh.com.br/
Endereço: Rua Guajajaras, 1353 - Terminal JK 
Data: 7/12
Horário: 21h
Ingresso: R$15,00 (ant.) R$18,00 (port.)
Info: 31 3212.6122

domingo, outubro 12, 2014

Flávio "Santos" Show



No próximo domingo, dia 19/10, vou tocar no evento intitulado Flávio "Santos" Show. O show que ocorrerá na Casa Cultural Matriz será em benefício do amigo Flávio Elias Soares, locutor e ex-segurança da casa. Há cerca de dois meses, Flávio foi vítima do despreparo de dois guardas municipais em Belo Horizonte, numa agressão que resultou na perda da visão do olho direito. Para agravar mais a situação, ele já tinha apenas 40% da visão do olho esquerdo. Toda a renda do evento será revertida para despesas médicas, entre outras, uma vez que ele ainda não pôde retornar ao trabalho.

A primeira vez que tive contato com o Flávio, ele estava trabalhando na portaria da Casa Cultural Matriz, onde eu tocava com certa frequência. Logo na entrada percebi a voz marcante de Flávio quando ele perguntou o meu nome para conferir na lista da produção. Batendo um papo com ele mais tarde, ele começou a imitar personalidades como o Sílvio Santos (que rendeu o apelido dos frequentadores, e explica o nome do evento) e Clodovil Hernandez. Num dos festivais que realizei na casa, aproveitei essa habilidade dele para fazer uma brincadeira com a plateia, enquanto eu estava no palco conversava ao microfone com ele como se estivesse falando ao celular. Escondido no camarim Flávio imitava a voz do "homem do Baú" e prometia que estaria no palco para entregar pessoalmente o troféu à banda vencedora do festival. Eleita a banda, Flávio subiu ao palco literalmente dando um show em sua interpretação do Senor Abravanel que levou a plateia às gargalhadas durante alguns minutos.

O show de domingo está sendo organizado de forma coletiva e contará com diversas bandas da cidade que conheceram Flávio durante o tempo que trabalhou na Matriz. Para essa ocasião especial, convidei meu amigo Rodrigo Braga para me acompanhar em algumas canções. No repertório pré-selecionado incluímos músicas de Hendrix, Dylan, Barão Vermelho, Nei Lisboa, Raul Seixas e Ramones

O evento contará ainda com as bandas: Marla, Evil Matchers, Lumière, Dead Pixels, Drunk Demons, Retoma e Martyrizer. Mas, o que vale mesmo nessa data é rever o amigo, Flávio e mobilizarmos as pessoas sobre o lamentável ocorrido, não deixando que o caso passe impune.


Links para que possam conhecer o caso da forma mais isenta possível:  

http://noticias.r7.com/minas-gerais/guarda-municipal-abre-portaria-para-investigar-agressao-contra-locutor-26082014

http://www.otempo.com.br/cidades/vendedor-denuncia-guardas-municipais-por-agress%C3%A3o-em-bh-1.905003

https://www.youtube.com/watch?v=IWE0G_rL9DU

E aqui um vídeo de quatro anos atrás de um programa TV Alterosa de Minas Gerais mostrando o trabalho de Flávio:

https://www.youtube.com/watch?v=9pmoAuiMs-U


Vídeo do Flávio convidando para o show:

https://www.facebook.com/video.php?v=371838196305832&set=vb.185603164929337&type=2&theater



Local: Casa Cultural Matriz – http://matrizbh.com.br/
Endereço:
Rua Guajajaras, 1353 - Terminal JK 
Data: 19/10
Horário: 14h
Ingresso: R$12,00
Info:
31 3212.6122


domingo, outubro 05, 2014

Engenheiros do Hawaii - Uma Breve Viagem Discográfica: Os Anos Gessinger, Licks & Maltz

9. Posfácio

Simples de Coração (1995)






Como havia dito na postagem sobre o disco Filmes de Guerra, Canções de Amor, resolvi adicionar um posfácio à série publicada aqui sobre os discos dos Engenheiros do Hawaii gravados pela formação Gessinger, Licks & Maltz. O texto que segue abaixo é uma adaptação de um comentário que escrevi no blog de Humberto Gessinger em 11 de janeiro de 2012, quando ele comentava sobre o disco em questão.

Depois da saída do guitarrista Augusto Licks, a banda admitiu de imediato o guitarrista Ricardo Horn, o músico faria alguns shows com Humberto e Carlos ainda no formato trio. Sem alcançar a sonoridade desejada por eles, ou tentando fugir de se tornar um cover de si mesma, eles acabaram optando pela entrada de mais dois novos membros: o guitarrista Fernando Deluqui (ex-RPM) e o tecladista e acordeonista Paolo Casarin, transformando em quinteto a banda que sempre havia sido um trio. 

Simples de Coração foi o primeiro disco da banda a não sair em vinil. A capa apresentava diferenças estéticas em relação aos trabalhos anteriores, começando pela ausência das engrenagens (presente nos sete discos do período GLM) e a mudança da fonte com o nome da banda (na edição em CD, um adesivo com o nome da banda vinha colado sobre a caixinha de acrílico, um Sagrado Coração estampava a capa).

No que tange a música, a banda apresentava inevitavelmente uma nova sonoridade em função da perda da guitarra tão característica de Augusto Licks. Os Engenheiros era uma das poucas bandas nacionais que tinha um som reconhecível logo na introdução de qualquer uma de suas músicas. Agora, eles apresentavam um som mais denso, de certa forma, devido à maior instrumentação das músicas com o formato quinteto e ainda a presença de músicos adicionais em várias faixas. Outra diferença fundamental foi a presença do produtor americano Greg Ladanyi que já havia trabalhado com os Jacksons, Jeff Healey Band, Kansas, Fletwood Mac, Toto, entre outros, o que levou a banda a gravar em Los Angeles. Talvez pelo fato da banda ainda estar procurando uma nova cara, juntamente com as referências dos trabalhos anteriores, o disco acaba por parecer mais com o produtor do que com a banda, o que acaba por não ser algo totalmente negativo, uma vez que Greg conseguiu um som espetacular no disco que contou com bons arranjos, e fazendo até com que o fraco guitarrista (?) Deluqui soasse bem no disco (num nível que nunca o tinha ouvido nem antes, nem depois em sua carreira). Já com o excelente tecladista Paolo Casarin ele não deve ter tido muito trabalho, o músico adicionou excelentes teclados e acordeons às músicas. Ricardo Horn com alguns bons momentos de guitarra também não comprometeu, assim como Maltz, agora com suas levadas de bateria um pouco limitadas, aparentemente pela nova (e maior) formação. Humberto manteve suas boas linhas de baixo, soando como um baixista mais “tradicional”, perdendo muito da pegada mais “guitarrística” que Augusto Licks, dizia que ele tinha.

O disco abre com a música “Hora do Mergulho”,  mais exatamente ainda, com um coro infantil cantando à capella em sua introdução, precedendo à entrada da banda e o bonito arranjo de guitarra de Ricardo Horn. Ele também apresenta um bom solo no meio da canção. Humberto adiciona uma linha de baixo, fazendo um acompanhamento com acordes, algo não tão recorrente no instrumento. Na letra, Gessinger continuava mandando bem, rebuscando seu estilo e mitificando sua imagem: “Eu sou um déspota esclarecido/nessa escura e profunda mediocracia”. “À Perigo,” já apresenta o acordeom de Casarin, instrumento que seria uma marca do disco. Deluqui (pasmem!) realiza um bom solo de guitarra. Humberto fala de resistência: “eu sigo em frente, pra frente eu vou/eu sigo enfrentando a onda/onde muita gente naufragou”. “Simples de Coração” tem a melodia reaproveitada da música Sweet Begônia II (cuja letra consta no encarte do disco A Revolta dos Dândis, mas nunca foi lançada pela banda). Cantando corajosamemente em tons mais altos, esse talvez seja o melhor disco de Humberto como vocalista. “Lance de Dados” tem uma levada acústica e traz a participação especial do percussionista Luís Conte. A temática segue falando em resistência, sobrevivência, novos rumos e comenta sobre um acidente automobilístico sofrido por Humberto pouco tempo antes: “Os deuses jogam pôquer/E bebem no saloon doses generosas de BR101”. “A Promessa” foi a música de lançamento do disco, um bom trabalho de Horn e Deluqui fazendo dobras nas guitarras e o piano de Casarin. Gessinger recorria à sua linha de crítica social: “Propaganda é a arma do negócio/No nosso peito bate um alvo muito fácil”. “Por Acaso” ressalta a mistura que resultou na sonoridade do disco, um lado acústico com violões e acordeom induzindo à música gaúcha e, de outro lado, guitarras que puxavam um pouco para o hard rock setentista (essa era inclusive a principal referência do novo visual da banda). “Ilex Paraguariensis” gravada apenas com instrumentos acústicos traz mais claramente a influência da música gaúcha desde o título que leva o nome da erva-mate com a qual se faz a bebida tão apreciada nos pampas: “Hoje eu acordei mais cedo/Tomei sozinho o chimarrão”. “O Castelo dos Destinos Cruzados” de Carlos Maltz, Ricardo Horn e Kleber Lúcio trazia o baterista novamente nos vocais desde a música “Filmes de Guerra, Canções de Amor” gravada no segundo disco da banda. “Vícios de Linguagem” tem Casarin brilhantemente tocando piano e um hammond B3 e participação especial de Julia e Maxime Waters e Carmen Twillie nos backings vocals cantando versos em inglês que evocam muito o Pink Floyd. “Algo Por Você”, parceria de Gessinger e Deluqui, tem um efeito de distorção na voz que soa interessante na primeira audição, mas logo se torna cansativo nas audições seguintes. “Lado A Lado”, de Gessinger e Casarin, tem letra e melodia comoventes que ganham muito com o coro de Kipp e Mark Lennon. Kevin Cronin, vocalista da banda REO Speedwagon também participa da faixa, tocando violão. A letra traz mais uma referência à obra de Roberto e Erasmo Carlos (“Esqueça as curvas da estrada de Santos/Se tu quiseres saber quem eu sou”), dupla citada algumas vezes por Humberto em músicas como “Nossas Vidas” e “Sopa de Letrinhas”: Apesar dos esforços, a formação não emplacou. Humberto nunca pareceu ter realmente gostado do quinteto, nem do disco. O que foi comprovado com a dissolução da formação no ano seguinte, com Humberto investindo num projeto "quase" solo que foi o Gessinger Trio, para em seguida reformular os Engenheiros do Hawaii com novos integrantes, dessa vez até mesmo sem a presença do co-fundador da banda, Carlos Maltz.



P.S.: Eu sempre me pergunto por que continuar a escrever textos e resenhas como essa, se como dizia Ezra Pound: “a melhor crítica não adiciona nada para quem lê”. Ou como canta Humberto Gessinger em "Vícios de Linguagem": “o principal fica fora do resumo”. Talvez estes textos sirvam como despretensiosas recomendações aos poucos leitores, talvez sirvam para iniciar algumas discussões musicais, ou ainda, e mais provavelmente, não sirvam realmente para nada.

Em tempo: reproduzo abaixo nos comentários, o que escrevi na citada postagem de Humberto Gessinger que traz ainda um comentário de pessoa uma anônima sobre o tamanho do texto que escrevi na ocasião.

domingo, setembro 28, 2014

The Beatles In America – Spencer Leigh





Para quem gosta de Beatles, o assunto nunca acaba. Numa das últimas postagens, comentei sobre o livro Can’t Buy Me Love de Jonathan Gould que trata da história da banda, dando enfoque na repercussão que a banda causou na Inglaterra e nos EUA. O livro The Beatles In America: The Stories, The Scene, 50 Years On de Spencer Leigh, editado pela Omnibus Press em 2013, vai no mesmo caminho. Porém, tendo apenas os Estados Unidos como alvo (o autor tem ainda dois livros sobre os passos dos Beatles em Liverpool, e outro em Hamburgo). 

Tendo um estilo de diário e livro de fotografia, o volume repassa a trajetória da banda em terras norte-americanas desde a histórica primeira visita em 1964 até o rompimento oficial em 1970, não deixando de incluir uma introdução sobre os primórdios da banda na Inglaterra, e um prólogo no qual cita momentos relevantes de John, Paul, George e Ringo EUA depois da separação, entre eles, o fatídico assassinato de John Lennon em Nova York.

A intenção de Spencer Leigh não foi fazer um estudo e análise mais aprofundada da carreira dos Beatles, como fez Jonathan Gould em Can’t Buy Me Love. Leigh, na verdade, coletou materiais que ilustram bem o texto com muitas fotos, recortes de jornais, e declarações de artistas, entre outros norte-americanos que de alguma forma cruzaram o caminho dos FabFour. Nesse caso, The Beatles In America, funciona como um ótimo complemento ao livro de Gould. Sem edição em português, o livro ricamente ilustrado, vale até mesmo para quem não lê no idioma dos rapazes de Liverpool, em razão do extenso arquivo fotográfico.

domingo, setembro 21, 2014

Bob Dylan - Oh Mercy (1989)






Assim como me ocorreu com o disco Blue de Joni Mitchell, quando conheci esse disco de Bob Dylan não tinha noção alguma da grande importância que o mesmo teve em sua carreira. Só vim a descobrir a relevância do álbum para o artista ao ler seu livro intitulado "Crônicas – Volume Um", no qual ele dedica um dos apenas cinco capítulos totalmente a esse álbum. Oh Mercy representou uma fase de recomeço para Dylan. No livro ele narra todo o processo de feitura desse trabalho, desde a composição até o último take da gravação. Boa parte do texto cita o produtor Danny Lanois, com quem Dylan teve uma intensa convivência e divergências criativas durante o processo de gravação do álbum.

“Political World” foi a primeira música composta dessa leva e coube a ela também a função de abrir o disco. Com sonoridade sombria e uma voz rascante de Dylan, os versos inicias já definem a música: “We live in a political world, Love don't have any place” (Vivemos em mundo político, amor não tem lugar). A letra foi escrita toda de uma vez e tinha pelo menos o dobro dos versos antes do compositor descartar parte deles. 

“Where Teardrops Fall” soa muito próxima do Dylan dos anos 70, especialmente pelo lap-steel tocado por Lanois e a o acordeom de Rockin’ Doopsie.

Segundo Dylan, o produtor Danny Lanois considerava “Everthing Is Broken” uma canção descartável. Dylan obviamente discordava dele. E o tempo provou que o compositor estava certo. 

“Ring Them Bells” é uma das faixas mais “enxutas" do disco, com acompanhamento apenas de piano, teclados e guitarra; e tem uma letra de tom épico e religioso: Ring them bells, for the time that flies/For the child that cries/When innocence dies (Toque os sinos para o tempo que voa/Para a criança que chora/Quando a inocência morre).

“Man In The Long Black Coat” e “Shooting Star” foram escritas praticamente ao mesmo tempo. Sobre a soturna “Man In The Long Black Coat”, Dylan escreveu que ela “tenta falar de alguém cujo próprio corpo não lhe pertence. Alguém que amou a vida, mas não pode viver, e cuja alma se amargura porque outros são capazes de viver”. Incerto de que conseguiu escrever músicas históricas para o disco como desejava o produtor Lanois, Dylan acredita que tenha chegado perto em pelo menos duas, e essa seria uma delas. Ele pensou nela como a sua “I Walk The Line”, música de Jonnhy Cash, que na visão de Dylan: "promove um ataque a nossos pontos mais vulneráveis, as palavras afiadas de um mestre".

“Most Of The Time” tem uma letra romântica como provavelmente apenas Dylan escreveria, na qual os primeiros versos sequer revelam que este é o tema da canção na qual ele apresenta um personagem forte e confiante que se curva diante uma paixão e, consegue compor versos diferentes para um assunto totalmente trivial: “Most of the time/I'm clear focused all around/Most of the time/I can keep both feet on the ground/I can follow the path, I can read the signs/Stay right with it, when the road unwinds/I can handle whatever I stumble upon/I don't even notice she's gone/Most of the time” (Na maioria das vezes/Eu sou tranquilo e focado com o que acontece ao meu redor/Na maioria das vezes/Eu posso manter os dois pés no chão/Eu posso seguir o caminho/Eu posso ler os sinais/Permanecer assim, quando a estrada se desenrola/Posso lidar com qualquer coisa que eu esbarre/Nem sequer noto que ela se foi/Na maioria das vezes).

 A levada arrastada de “What good Am I?” soa como um blues improvisado. A letra também foi composta toda de uma vez, como Dylan revelou. 

“Disease of Conceit” que ele assume ter um toque gospel, nasceu a partir da notícia da proibição de pregar ao pastor Jimmy Swaggart que também foi destituído da liderança da Assembleia de Deus devido à sua ligação com uma prostituta. Dylan que discordava da punição escreve no livro: “A Bíblia está cheia dessas coisas. Um monte daqueles antigos reis e líderes teve várias esposas e concubinas, e o profeta Oséias até foi casado com uma prostituta e isso não o impediu de ser um homem santo. Mas aqueles eram outros tempos, e para Swaggart foi o fim da linha”. Para Dylan que gravou o piano nessa faixa, disse que Arthur Rubinstein teria sido o instrumentista perfeito para tocá-la.

“What Was It You Wanted?” foi outra que ele diz ter composto rapidamente, letra e melodia ao mesmo tempo. Depois de uma pausa, o compositor voltava à ativa com o ímpeto dos primeiros trabalhos. Os timbres de guitarra com bastante efeito de tremolo e reverb que aparecem em várias faixas do disco reaparecem aqui e Dylan adiciona solos marcantes de harmônica.

Para a gravação de “Shooting Star”, Dylan confessa que gostaria de ter um ou dois clarinetes na gravação, mas fizeram com o que estava disponível na ocasião: Brian na guitarra, Willie, na bateria, Tony no baixo e Lanois no omnichord (um instrumento de plástico que soa como uma cítara) e, ele na guitarra e harmônica. A canção que segundo Dylan foi uma daqueles que surgiram completas, lhe dá a sensação de que ele mais “a recebeu” do que compôs. Nas palavras do compositor, era como se ele estivesse viajando pela trilha do jardim do sol e simplesmente a encontrasse ali. “Ela era iluminada. Eu tinha visto uma estrela cadente do quinta de nossa casa, ou talvez fosse um meteorito”. 

Como afirmou Dylan no livro "Crônicas": “... o disco não me colocou de volta ao mapa do mundo do rádio... ele obteve algumas resenhas boas, mas resenhas boas não vendem discos. Todo mundo que lança um disco consegue pelo menos uma resenha boa, só que há sempre uma nova sagra de discos e um novo conjunto de resenhas”. Ainda assim o disco se tornou um trabalho extremamente importante na obra de Dylan, a ponto de ser o único a intitular um dos capítulos do seu livro de memórias. Concluindo com palavras do próprio: “O negócio musical é estranho. Você o amaldiçoa, mas o ama”.

Bob Dylan – voz, violões, guitarra, piano, harmônica, órgão
Daniel Lanois  – dobro, lap steel, guitarra, omnichord
Rockin' Dopsie – acordeom em "Where Teardrops Fall"
Willie Green – bateria em "Political World", "Everything Is Broken", "Most of the Time", "Disease of Conceit", "What Was It You Wanted", "Shooting Star"
Tony Hall – baixo em "Political World", "Everything Is Broken", "Most of the Time", "Disease of Conceit", "Shooting Star"
Malcolm Burn – meia-lua, teclados, baixo em "Everything Is Broken", "Ring Them Bells", "Man in the Long Black Coat", "Most of the Time", "What Good Am I?", "What Was It You Wanted"
John Hart – saxofone em "Where Teardrops Fall"
Daryl Johnson – percussão em "Everything Is Broken"
Larry Jolivet – baixo em "Where Teardrops Fall"
Cyril Neville – percussão em "Political World", "Most of the Time", "What Was It You Wanted"
Alton Rubin, Jr. – “Tábua de lavar” em  "Where Teardrops Fall"
Mason Ruffner – guitar on "Political World", "Disease of Conceit", "What Was It You Wanted"
Brian Stoltz – guitarra em "Political World", "Everything Is Broken", "Disease of Conceit", "Shooting Star"
Paul Synegal – guitarra em "Where Teardrops Fall"


Obs: Todas as citações de Bob Dylan foram retiradas do livro "Crônicas - Volume Um", editora Planeta, 2005.